Antes dos tempos atuais, os deuses caminhavam sobre a Terra junto aos humanos. Nessa Era de Ouro, Osíris se sentou no trono dos deuses e foi o primeiro faraó do mundo dos vivos, governando por muitas eras junto com sua rainha Ísis. Osíris era justo e correto, e com ele o mundo estava em equilíbrio.

Porém, Set, o irmão de Osíris, cobiçou seu trono e o poder sobre o mundo dos vivos, e quis arrancá-lo de seu irmão. Ele então armou um plano para matar Osíris e ficar em seu lugar.

Set construiu uma caixa e lhe pôs uma magia perversa, que faria com que qualquer um que entrasse nela ficasse preso. Então, ele a levou para a grande festa dos deuses, e esperou que Osíris estivesse embriagado para lhe desafiar em uma disputa, onde cada um deveria entrar na caixa, e depois sair usando sua força.

Osíris, seguro de seu poder, mas fraco por causa da bebida, entrou na caixa, e Set rapidamente derramou chumbo derretido nela. Osíris tentou escapar, mas a magia o prendeu e ele morreu. Set então pegou a caixa e atirou-a no rio Nilo, onde ela foi levada para longe.

Feito isso, Set reivindicou o trono de Osíris e exigiu que Ísis se tornasse sua rainha. Nenhum dos outros deuses ousou ficar contra ele, pois ele havia matado Osíris e poderia facilmente fazer o mesmo com eles, então eles se transformaram em animais para se esconder de Set.

O desequilíbrio do mundo e as guerras

Este foi um tempo sombrio, pois ao contrário de seu irmão, Set era cruel e indelicado, não se importando com o equilíbrio de mundo. A guerra dividiu o Egito e já não havia lei durante seu governo, e o povo gritava e implorava para Rá, mas ele não os queria ouvir.

Apenas Ísis se lembrou de seu povo, e não tinha medo de Set. Então, ela procurou em todo o Nilo pela caixa contendo seu amado marido, até que a encontrou presa em uma árvore, que se tornou grande e poderosa por causa dos poderes de Osíris. 

Ísis levou a caixa de volta para o Egito e colocou-a na casa dos deuses. Ela se transformou em um pássaro, voou sobre o corpo sem vida de Osíris e lhe lançou um feitiço. O espírito de Osíris entrou nela e ela concebeu um filho, cujo destino seria vingar seu pai. A criança foi chamada de Hórus, e foi escondida em uma ilha distante, longe dos olhares de seu tio Set.

Ísis então foi até o sábio Thoth e implorou sua ajuda. Ela pediu a ele que usasse mágica para trazer Osíris de volta à vida. Thoth, senhor do conhecimento, sabia que o espírito de Osíris havia partido de seu corpo e estava perdido, e para que ele pudesse voltar a vida, Thoth teria que refazer seu corpo, para que o espírito o reconhecesse e voltasse.

Thoth e Ísis juntos criaram o Ritual da Vida, que permitiria que os seres vivessem para sempre após a morte. Mas antes que Thoth pudesse trabalhar em sua magia, Set os descobriu. Ele roubou o corpo de Osíris e o cortou em vários pedaços, espalhando-os pelo Egito, para que Osíris nunca pudesse renascer.

O ritual da mumificação e embalsamamento

Anúbis embalsamando
O ritual de embalsamamento


No entanto, Ísis não se desesperou, e implorou a ajuda de sua irmã Néftis, para ajudá-la a encontrar os pedaços de Osíris. Elas procuraram por muito tempo, trazendo cada parte para Thoth, e quando todas as peças estavam juntas, Thoth foi até Anúbis, senhor dos mortos.

Anúbis costurou os pedaços juntos, lavou as entranhas de Osíris, embalsamou-o, enrolou-o em linho e lançou o Ritual da Vida. Quando a boca de Osíris foi aberta, seu espírito entrou e ele viveu novamente.

O julgamento dos mortos

Reino dos mortos
Julgamento no mundo dos mortos


No entanto, nada que tenha morrido, nem mesmo um deus, poderia habitar a terra dos vivos. Então Osíris foi o mundo inferior, onde Anúbis lhe entregou o trono, tornando-o senhor dos mortos. Lá ele é responsável pelo julgamento sobre as almas dos falecidos, levando os justos para a terra abençoada, e condenando os perversos.

Quando Set soube que Osíris estava novamente vivo, ele ficou irado, mas sua raiva diminuiu, pois ele sabia que Osíris jamais poderia voltar para a terra dos vivos. Sem Osíris, Set acreditava que ele se sentaria no trono dos deuses por toda a eternidade. No entanto, enquanto isso, Hórus crescia com valentia e força, escondido na ilha. Quando ele ficou preparado, sua mãe lhe deu uma forte magia para usar contra Set, e Thoth o presenteou com uma faca mágica.

O direito ao trono pelos faraós

Hórus procurou Set e desafiou-o para o trono. Set e Hórus lutaram por muitos dias, mas no final Hórus o derrotou, mas não o matou, pois derramar o sangue de seu tio não o faria melhor que ele.

Ambos reivindicaram o trono, e os deuses começaram a lutar entre si, com uns apoiando Hórus, e outros à Set. Para que o mundo não ficasse mais desequilibrado, os deuses foram procurar o conselho do sábio Neith, que afirmou que Hórus era o legítimo herdeiro do trono. Hórus então mandou Set para a escuridão e governou o Egito. Durante todo o reino egípcio, os faraós legitimaram seu direito ao trono, por serem o próprio Hórus-vivo.

Assim, essa história conta como Hórus cuidou de seu povo durante a vida, e seu pai, Osíris, julga os mortos e os cuida durante sua próxima vida.

Enquanto isso, Set eternamente se esforça por vingar-se, lutando contra Hórus em todas as eras. Quando Hórus vence, o mundo fica em paz, e quando Set vence, há guerras, crise e fome. Porém, os egípcios não se desanimavam, pois sabiam que os tempos sombrios não duravam para sempre, e os raios de Hórus brilhariam mais uma vez.

As "grandes histórias" do mundo

O mito de Osíris é considerado pelo grande autor britânico Neil Gaiman uma das "Grandes Histórias" do mundo. Essas Grandes Histórias fazem parte da experiência humana e elas nunca mudam, exceto em sua forma mais superficial. Seus detalhes pode ser modificados dependendo de quem conta a história, e os personagens podem ter nomes diferentes, mas fundamentalmente, ainda é a mesma história.

Uma versão do mito de Osíris existe em todas as culturas: o rei justo é assassinado por seu irmão cruel, apenas para ser vingado pelo príncipe que segue os passos de seu pai. Às vezes, o rei morto é recompensado por seus modos corretos em sua próxima vida.

Podemos encontrar outras versões da história de Osíris em civilizações próximas, como os gregos e romanos, no longínquo Japão e na China, no cristianismo, e até mesmo em Shakespeare, onde o príncipe vingador se chama Hamlet.

Essa história, assim como muitas outras "grandes histórias", faz parte de um inconsciente coletivo, sendo reproduzida nas mais distintas culturas, como forma de dar uma explicação para os fatos da vida.


Extraído de hipercultura.